QUERIA
MESMO ERA MUDAR PARA O MEU BRASIL
O
rescaldo eleitoral, até o momento, tem sido pior do que a campanha
em si. Ontem mesmo um amigo falava sobre sua esperança de que tudo
isso tenha contribuído para trazer o debate político para o
cotidiano das pessoas, para que elas percebam que a política e os
políticos são fundamentais para seu cotidiano e sua vida. Acho
pouco provável: já tem gente por aí dizendo que “vai voltar para
sua vida normal”, como se as decisões políticas não fizessem
parte de sua “vida normal”. Consciências de ocasião certamente
não produzem posições politicas sólidas.
O que se
vê, é basicamente o mesmo país de sempre, pelo menos na minha
leitura. Eu, votei em Aécio Neves e fiz campanha por Aécio Neves.
Pela alternância no poder, fundamental para qualquer país
democrático, especialmente os países presidencialistas, onde uma
vez eleito, dificilmente se consegue mudar o rumo das coisas sem
grandes traumas ou rupturas institucionais – fossemos uma república
parlamentarista mudanças na composição do parlamento poderiam
significar correções ou novas escolhas de forma mais eficiente.
Eu votei
em Aécio Neves por discordar da condução da economia brasileira
como um todo, e por discordar do modelo de políticas sociais –
algumas pessoas acreditam que “inventaram a roda” e que esse
modelo petista é o melhor ou único que existe. Isso não é
verdade: existem outros modelos mais eficientes e que tornam os mais
carentes menos dependentes de quem afirma lhes conceder um favor,
quando na verdade isso é um direito do cidadão e um dever do
estado, somente. Aécio Neves não representava o modelo que eu
considero ideal, mas era um passo nesse sentido.
Eu votei
em Aécio Neves para interromper a transformação da corrupção em
prática de estado, contra a institucionalização da corrupção
que vem, inegavelmente, sendo feita neste país. A afirmação de que
há corrupção para todo lado é pequena demais diante do que vem
acontecendo.
Eu votei
em Aécio Neves contra atitudes autoritárias comuns ao partido no
poder, e sua derrota poderia significar um retorno a práticas menos
abusivas e ao desaparelhamento do estado brasileiro.
Enfim,
votei por motivos políticos, nos quais acredito. E continuo
acreditando.
Mas, é
claro que nem todos que votaram em Aécio Neves votaram pelos meus
motivos. Vejo propagandas, por exemplo, retomando propostas
separatistas de São Paulo: curiosamente, o mesmo estado onde nasceu
o PT. O mesmo estado que projetou Lula e seu partido no cenário
nacional. Das grandes lideranças petistas, a maior parte é paulista
ou teve sua vida política ligada a São Paulo. Outros, são
representantes de famílias tradicionais da elite paulistana, como os
Matarazzo e os Suplicy.
Vejo
também a pregação de ódio aos nortistas e nordestinos, enquanto
durante toda a campanha troquei opiniões e esperanças com os amigos
nortistas e nordestinos. E o ridículo “vou embora do Brasil” -
na verdade, seria ótimo que fossem. É um direito de cada um viver
onde deseja, e a nós, que nos preocupamos de fato com nosso país, a
nós que desejamos construir um país melhor para todos nós, essas
pessoas realmente pouco acrescentam.
Vejo
também eleitores do PT indignados com essas atitudes. Estão certos,
é de se indignar. Mas, acredito que deveriam se indignar também com
os petistas que chamam os eleitores de Aécio de “filhinhos de
papai”, de “fascistas”. Deveriam se indignar quando petistas
destilaram seu ódio contra São Paulo, no primeiro turno. Deveriam
se indignar ao afirmar que quem vota em Aécio “só pensava em si
mesmo e não nos mais humildes”: o PT não tem o monopólio da
sensibilidade social, sinto muito. Só há quem pense nela de forma
diferente.
Deveriam
se indignar quando petistas sugeriram que Rachel Sherazade deveria
ser estuprada. Deveriam se indignar quando petistas fizeram ameaças
de morte à família de Aécio Neves. E muitas coisas mais.
Não
acredito na indignação destes diante da estupidez que vemos sobre o
nordeste e outros temas: é uma indignação política, e não uma
verdadeira defesa da tolerância e do respeito. Estes, foram tão
preconceituosos, desrespeitosos, “fascistas” e intolerantes
quanto aqueles.
Mas,
felizmente ainda posso receber um abraço de meus alunos e amigos
petistas ou não petistas mas que votaram em Dilma, por seus motivos
tão válidos quanto os meus: apenas discordo deles. E isso não dói
em nenhum de nós. Nos respeitamos de diversidade, que é a única
coisa que existe de fato, entre as pessoas.
Portanto,
declaro que continuo preferindo morar no meu Brasil, no Brasil onde
moramos todos os que votaram em Aécio e todos que votaram em Dilma,
e todos que votaram nulo, e todos que preferiram ir pescar do que
perder tempo com candidatos que eles acreditavam que não iam mudar
coisa alguma no país.
No meu
Brasil, que luto pra construir e continuarei lutando, cada um vai
poder fazer as opções políticas que quiser, por seus motivos, por
seus valores e ideias, e os outros, que não compartilham deles,
poderão sagradamente discordar . Discordar não faz ninguém mais ou
menos inteligente que o outro: só diferente.
No meu
Brasil, seremos diferentes alegremente. Só concordaremos que é
proibido não tolerar a discordância. A diversidade é isso:
conviver com a certeza de que ninguém é como nós, e não a
tentativa de igualar todos nós.
O mundo é
feito de diferenças, não de igualdades. Ideais que impunham
igualdades aos desiguais já produziram tragédias demais na
humanidade. Se formos dividir o país em função de nossas
diferenças, construiremos um país com 200 milhões de ilhas.
E
certamente eu sentiria falta de alguém que me dissesse: “eu
discordo de você”. E morreria no tédio, na solidão das verdades
absolutas.